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1. Qual a importância do projeto da APIGRAF de comemoração dos 170 anos de associativismo gráfico para o setor em Portugal?

Como setor de atividade económica e como associação temos um enorme orgulho no nosso passado e confiança no nosso futuro. Temos a perfeita noção do impacto desta indústria na evolução da sociedade ao longo dos tempos, em Portugal e no mundo, e era importante fazer um trabalho de recolha e análise que permitisse perceber o papel do associativismo ao longo de enquadramentos tão diversos como os que se sucederam nestes 170 anos. A associação é necessariamente mais do que a soma dos seus membros, mas são os associados e o setor a sua razão de existir e a sua bússola de atuação. Ao historiar o associativismo gráfico estamos a historiar o setor e o seu impacto na sociedade, e atento o património documental que identificámos era de facto importante não o perder. É um trabalho importante para todos e só possível mediante o esforço concertado dos diversos intervenientes e parceiros. Diria portanto que a importância desta iniciativa reside na salvaguarda e interpretação de um património histórico relevante, na evidência do associativismo como via de eficaz conjugação de esforços e interesses comuns, e na promoção da indústria gráfica como essencial, ao longo dos tempos e também no futuro, para o funcionamento da nossa vida em sociedade.

Deixo uma nota adicional, relativa ao que consideramos, neste âmbito, ser a indústria gráfica: não se trata apenas da área de trabalhos impressos clássicos; é também toda a demais impressão sobre os mais variados suportes e dos mais diversos produtos, bem como toda a área da embalagem e da comunicação digital em que trabalhamos. Tudo isto é indústria gráfica. 

 

2. O que motivou a inclusão de empresas históricas como a Ruy de Lacerda neste marco comemorativo?

Parte da resposta está na pergunta: ser uma empresa histórica é uma mais valia, pela necessária identificação com a intenção que norteou esta iniciativa e pela experiência acumulada.

Por outro lado, é uma empresa parceira da indústria gráfica, que desde o primeiro momento se mostrou disponível para colaborar, numa fase em que o trabalho ainda era essencialmente de pesquisa e redação. E compreendeu desde logo os temas da salvaguarda do património, da mais valia do modelo de colaboração associativo, da relevância de um trabalho objetivo e tecnicamente bem suportado para evidenciar, interna e externamente, a relevância e perenidade desta indústria.

Acresce que o setor, embora segmentável, é na verdade uma cadeia de produção interdependente, cujos elementos se influenciam mutuamente. Não concebemos a indústria gráfica como algo isolado, mas antes como um universo estreitamente relacionado com os seus parceiros, a montante e a jusante.

 

3. De que forma a Ruy de Lacerda, com a sua experiência e longevidade, contribuiu para enriquecer este projeto?

Para além do referido na questão anterior, diria que desde logo a experiência da Ruy de Lacerda terá contribuído para intuir facilmente a relevância desta iniciativa e determinado a sua disponibilidade para colaborar.

Por outro lado, sendo uma empresa que trabalha há muito com a nossa indústria, identificou-se com o que viria a ser o conteúdo da obra comemorativa dos 170 anos de associativismo na indústria gráfica, porque é um mundo que conhece muitíssimo bem. Se a objectividade da pesquisa e do levantamento de informação foram critérios deste trabalho, poder contar com a apreciação critica de todos quantos conhecem bem esta indústria assegura a qualidade e rigor do resultado.

E ter a Ruy de Lacerda envolvida nesta iniciativa é, naturalmente, ter um parceiro de prestígio que nos distingue com a sua confiança e apoio, o que muito agradecemos.

 

4. Quais foram os maiores desafios na criação do livro e o que mais surpreendeu durante o processo?

Destacaria duas grandes áreas, nas quais se incluem a maior parte dos desafios enfrentados ao longo deste processo.

Por um lado, a pesquisa. O período estudado é longo, a interação interna e com terceiros é intensa, os impactos sociais e empresariais são muitos, os testemunhos documentais e da indústria são mais do que é possível sintetizar no trabalho realizado. Portanto fazer a pesquisa, um trabalho que ficou a cargo da investigadora Cláudia Figueiredo, do Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova, foi um desafio bom pela quantidade, qualidade e antiguidade do material de investigação disponível.

Por outro, a concretização física do trabalho. Tratando-se de uma publicação comemorativa que pretende ter também um impacto extra-setorial, era fundamental ter uma forma que acompanhasse a qualidade do conteúdo. Requereu, naturalmente, uma conjugação de esforços entre empresas do setor – numa verdadeira demonstração de associativismo – e com os parceiros do projecto que foi muito desafiante, atenta a dimensão do projecto e a especificidade do setor. Mas julgamos que foi plenamente conseguido. As reações que temos, dentro e fora da indústria, são muitíssimo positivas. Quem é “gráfico” reconhece tecnicamente a complexidade e rigor do trabalho e a excelência do resultado. Quem não é “da área” faz o mesmo mas de forma sensorial e intuitiva, ao folhear, observar detalhes e tocar nas superfícies trabalhadas ao longo das páginas dos dois volumes. Este trabalho só foi possível de concretizar com a colaboração das empresas que acreditaram no projecto, o apoiaram e nele trabalharam. A todos, devidamente registados nas páginas dos dois volumes, a APIGRAF está muitíssimo grata. Valeu de facto a pena.

 

5. Que impacto espera que esta obra tenha junto dos associados e da sociedade em geral?

Junto dos associados, ou melhor, do setor, destacaria dois.

Está já a ter um dos efeitos pretendidos, que é o do orgulho de cada empresa pelo facto de integrar esta indústria e o reconhecimento de que está sempre presente, de forma discreta mas fundamental, na sociedade. Sendo esta indústria fundamental para a área da comunicação, não deixa paradoxalmente de ser frequente que as empresas não priorizem a sua própria comunicação enquanto organizações que conseguem conjugar excelentemente qualidade, sustentabilidade, prazo e preço na produção dos mais desafiantes trabalhos.

Outro efeito, ainda junto deste universo empresarial, é o da perspectiva real da comunidade a que pertencemos, do quão profundas são as suas raízes, da extensão do seu impacto. A comunidade do setor gráfico existe há muito e caracteriza-se por uma enorme flexibilidade e resiliência, o que esta obra comprova factualmente.

Junto da sociedade em geral esta obra é mais uma – e muito importante – ferramenta de interiorização de mensagens e conceitos que a APIGRAF transmite incessantemente. É importante que esta indústria seja apreendida como o que realmente é: uma atividade essencial à sociedade, desenvolvida por empresas sustentáveis e capazes de responder aos mais complexos desafios, que produzem muito mais do que apenas livros, revistas e jornais – pense-se em todas as embalagens, impressão funcional, têxteis, peças decorativas, materiais publicitários, sinalização e tantos outros produtos – e que utilizam equipamentos de avançada tecnologia e elevada automatização.

 

6. Como vê o futuro do setor gráfico e o papel de empresas como a Ruy de Lacerda nesse contexto?

O futuro deste setor, como o de qualquer outro, assenta em diversos temas, de que destacaria o binómio procura/oferta e a sustentabilidade, no seu sentido mais lato. E este setor está bem colocado em ambas as áreas.

Por um lado, trabalha em produtos cuja procura se mantém elevada, embora naturalmente registem alterações e adaptações ao longo do tempo. Já não é vulgar encontrar quem veja o setor de forma anacrónica, e as fotografias que apresentamos na obra comemorativa dos 170 anos de associativismo industrial gráfico, todas tiradas em empresas portuguesas atuais, contribuem para afastar definitivamente essa imagem. A história que o primeiro volume conta permite perceber como a indústria respondeu às mutações sociais, políticas e tecnológicas, até por ser uma atividade na qual os impactos se sentem de forma quase imediata, uma espécie de “barómetro” económico. Como as empresas se adaptaram e progrediram, como alteraram produtos e processos, como diligenciaram integrar a sustentabilidade na sua prática diária. São estas empresas que produzem boa parte dos produtos gráficos que todos os dias, a todas as horas, fazem parte da nossa vida. 

Por outro lado trata-se de uma indústria que há muitos anos começou a adaptar-se em termos de sustentabilidade, no sentido mais lato, que integra as vententes ambiental e económica. Embora trabalhemos sobre uma multiplicidade de suportes, os materiais mais utilizados são o papel e o cartão, cujo perfil de sustentabilidade e circularidade está amplamente estudado. A tripla pressão sobre matérias primas, processos e produtos – interna, estatal e de clientes – levou a que as empresas se fossem paulatinamente adaptando ao enquadramento legal aplicável e procurando soluções eficazes e economicamente viáveis. É hoje um setor que possui soluções sustentáveis e um saber acumulado de grande utilidade num momento em que, por exemplo, o eco-design ganha uma enorme preponderância em termos legais e sociais.

A Ruy de Lacerda, pelas áreas em que desenvolve a sua atividade e pelos diversos materiais de suporte com que trabalha conhece bem estes temas, trabalhando-os quer nos serviços que presta e nas matérias primas que fornece, quer na sua estratégia empresarial. Portanto vemo-la necessariamente como um elo da cadeia de sustentabilidade da indústria, no duplo sentido referido.

 

7. Como a APIGRAF acredita que esta celebração dos 170 anos pode inspirar as próximas gerações no setor gráfico?

De forma sintética, diria que pela evidência que se trata de uma indústria com muito passado e muito futuro.

A obra que editámos não se foca apenas na história do associativismo, contando também com uma análise da evolução do setor nos próximos 10 anos, e expectavelmente a conclusão é a de que, nas diversas áreas em que se segmenta, haverá muito e muito bom trabalho a desenvolver, com a combinação de qualidade e apelo aos sentidos que esta indústria faz tão bem. O que verificamos ao falar com um leque alargado de interlocutores, dentro e fora do setor, é que nos campos da criatividade, da operacionalização optimizada de equipamentos de elevada tecnologia, da gestão e logística, e também da operação fabril propriamente dita, existe um mundo de possibilidades que a sempre crescente integração de soluções de automatização e inteligência artificial está a transformar, mantendo contudo a necessidade do fundamental elemento humano. Cremos portanto que, para uma multiplicidade de perfis e competências, continuará a ser um opção profissional com futuro.

É também importante evidenciar, a cada nova geração, a história dos que a precederam, o que reforça a cabal compreensão das opções tomadas a cada momento, a percepção de que nem sempre a consequência mais expectável é a que se concretiza, o sentido de pertença a esta comunidade.

E mesmo para quem não desenvolva a sua atividade no setor ou em áreas que com ele se ligam diretamente, a materialidade característica da maior parte dos trabalhos das nossas indústrias que desperta nos utilizadores uma interação de sentidos única. É muito interessante observar a reação aos livros comemorativos dos 170 anos de associativismo, a irreprimida vontade de “passar a mão” nas páginas para sentir os detalhes, a curiosidade pela forma como se apresenta a página ou o capítulo seguinte. “Sentir” esta obra ajuda a tomar consciência da quantidade de produtos do setor que nos cercam e da razão pela qual são, frequentemente, tão apelativos.

 

8. Há alguma história ou momento específico destacado no livro que considere particularmente marcante?

A pesquisa feita identificou temas, protagonistas e impactos que, estamos certos, os leitores reconhecerão, e com os quais, em diversos casos, se identificarão. 

Achei particularmente interessante o aprofundar do conhecimento sobre a origem mutualista deste movimento associativo, assente na convicção, que nos norteia até hoje, de que somos muito mais do que a soma das partes. Os “fundadores” perceberam que um formato colaborativo era algo que lhes permitia uma visão mais ampla da realidade, mais eficácia na sua ação e melhores resultados do trabalho desenvolvido.

 

Por Teresa Borba